sábado, 27 de fevereiro de 2010

Noite de passadeira vermelha no Correntes d’Escritas

INFOPÓVOA / PÓVOA DE VARZIM
A passadeira vermelha no exterior do Auditório Municipal anunciava que algo que de diferente se ia passar. De facto, ontem à noite, numa parceria estabelecida com o Correntes d’Escritas, a revista LER e a Booktailors entregaram os Prémios de Edição, numa cerimónia divertida e recheada de merecidos aplausos.
Foram atribuídos duas dezenas de prémios. Nove ao melhor do trabalho editorial, seleccionados por um júri, votados por outro júri e pelo público. E onze prémios especiais, concedidos como o reconhecimento da comunidade a figuras importantes da edição.
Assim, foram vencedores:
Melhor Design de Literatura: Contos Completos, de Truman Capote, da Sextante Editora;
Melhor Design de Não-ficção: Uma Ideia da Índia, de Alberto Moravia, da Tinta-da-China; Melhor Design Infantil e Juvenil: Trava-Línguas, de Dulce de Souza Gonçalves, da Planeta Tangerina; Melhor Design de Livro Escolar: História 9; Ana Oliveira e outros, da Texto Editora;Melhor Design de Arte e Fotografia: Berlim – Reconstrução Crítica, com coordenação de Pedro Baía, da Circo de Ideias; Melhgor Design de Colecção: Colecção BisLeya, Leya; Melhor Design de Gastronomia: Receitas Go Natural, de Frederico Carvalho, pela Tinta-da-China; Melhor Fotografia Original: O Mundo é tudo o que acontece, de Pedro Paixão (texto e fotografia), pela Quetzal; Melhor Ilustração Original: Crónicas dos Bons Malandros, de Mário Zambujal, com ilustrações de João Fazenda, pela Quetzal.
Prémio Especial Carreira: Luís Oliveira, da Antígona; Prémio Especial Editora do Ano: Dom Quixote;


Prémio Especial Editora Revelação: Editora Planeta Tangerina;
Prémio Especial Artes Gráficas: Jorge Silva;
Prémio Especial Tradução: José Bento;
Prémio Especial Inovação: Colecção Literatura de Humor, da Tinta-da-China;
Prémio Especial Livreiro: Duarte Nuno Oliveira e Caroline Tyssen (Livraria Galileu);
Prémio Especial Livraria Independente: Ler Devagar;
Prémio Especial Jornalista ou Imprensa de Edição: Eduardo Pitta;
Prémio Especial Blogue de Edição: Os Livros Ardem Mal;
Prémio Especial promoção de autor português: Editorial Caminho, pela promoção de José Saramago.
Luís Diamantino, Vereador do Pelouro da Cultura da Câmara Municipal da Póvoa de Varzim, entregou o Prémio Especial Editora do Ano e aproveitou para dizer que “é um grande prazer ter-vos cá e ter aceite este desafio de receber a entrega dos Prémios de Edição”. Sublinhando que esta cerimónia foi um dos muitos eventos que contribuiu para que o programa do Correntes d’Escritas fosse diferente, deixou o repto, “precisamos de pessoas especiais”. E reconhecendo o trabalho que os editores têm feito pela promoção do Correntes d’Escritas confessou que “para as Correntes d’Escritas todos os editores merecem este Prémio”.
José Francisco Viegas, em representação da revista LER congratulou-se pelo facto de a entrega de prémios decorrer num universo de autores, editores, livreiros, leitores. “A primeira vez que se quis organizar um evento desta natureza foi no início dos anos 90”, contou, uma ideia que por muitos foi considerada absurda. “A diferença é que há agora parceiros à altura. Os parceiros chamam-se Booktailors. A existência de um gabinete de consultores editoriais especialistas em edição mudava tudo pelo entusiasmo que colocaram no desenvolvimento da ideia”. E assim foi. E se no ano passado a primeira edição dos Prémios de Edição Ler/Booktailors foi experimental, este ano foi feita pela primeira vez em público.
O programa do Correntes d’Escritas entra hoje no seu último dia, com a realização de duas mesas de debate, Às 10h30 e às 16h00, seguida da sessão de Encerramento, às 18h00. Conheça melhor o programa no
portal municipal.

Perversão, Imaginação e Literatura na 7ª mesa de debate

INFOPÓVOA / PÓVOA DE VARZIM
A Literatura perverte a imaginação. Tema da 7ª mesa de debate, permitiu diversas leituras a todos os que nele participaram – Leonor Xavier, Malangatana, João Manuel Ribeiro, Manuel Jorge Marmelo e Gonzalo Celorio.
No papel de moderador, Ivo Machado lançou as primeiras perguntas sobre o tema “Perverte a imaginação de quem? Do leitor ou do criador?”
Leonor Xavier tratou de procurar cada uma das palavras no dicionário. Se Literatura e Imaginação dispensam pesquisa, o mesmo não se pode dizer de perverte, “que nada tem a ver com perversão, é o contrário, porque é tornar perverso ou mau, corromper”. Na sua busca por mais opiniões sobre o tema, acabou por recordar uma amiga sua, portuguesa, Maria Adelaide Amaral, que escreve novelas e peças de teatro no Brasil. “A Maria Adelaide tem uma palavra fantástica para as situações que a gente não consegue enfrentar”. Essa palavra é instigante, a mesma que, contou Leonor Xavier, uma amiga sua brasileira, psicanalista, utilizou como resposta ao seu pedido de ajuda sobre o tema. Depois, a escritora fez “uma pesquisa pelos meus amigos portugueses e um deles, de uma geração abaixo, disse ‘Ela não perverte mas potencia a imaginação”. Eu respondi ‘ela subverte’ e por aí fora, podemos pôr todo o género de sufixos e prefixos. É uma coisa torrencial, podíamos estar horas a falar sobre isto”. Lendo um poema que escreveu em memória de David Mourão-Ferreira, “pessoa muito importante para a minha geração”, a escritora e jornalista terminou dizendo que mais não sabia dizer, “não sei se perverte, se subverte, se potencia, tudo isto é muito complicado”.
O mexicano Gonzalo Celorio apresentou uma comunicação onde, por um lado, concordava com o tema, por outro não. “Eu estou de acordo em certo sentido, em termos editoriais e estritamente contemporâneos, porque tenho a impressão que boa parte da narrativa de hoje em dia sacrificou a imaginação”, considerando que crê ter passado o tempo “da narrativa do real maravilhoso e do fantástico”. Discorda, mas termos conceptuais. Isto porque defende que “a imaginação pressupõe a distorção da realidade e, geralmente, pressupõe a ampliação das categorias da realidade. A imaginação é que, de alguma forma, perverte a realidade convencional”. Na sua opinião, não há literatura sem imaginação, mas o oposto pode acontecer. Literatura e imaginação “associam-se frente à realidade e são a literatura e a imaginação que pervertem a realidade”. Acrescentou ainda que não só pervertem mas convertem, advertem, invertem, subvertem, divertem, entre os muitos sufixos e prefixos já mencionados por Leonor Xavier.

Manuel Jorge Marmelo “perverteu” o tema usando o seu último livro, As Sereias do Mindelo. “Mais do que a imaginação, a Literatura começou a perverter a minha realidade”, e contou uma série de peripécias e coincidências que ocorreram já quando estava a finalizar o livro. De facto, estando ele a escrever sobre uma personagem que tentava, sem sucesso, chegar a Cabo Verde, também ele, de férias marcadas para este país, mais concretamente para Mindelo, viu o seu voo ser cancelado. “Tal como a minha personagem, também eu não estava a conseguir chegar ao destino”. Vendo nisto um aviso, decidiu cancelar a viagem. Pouco depois, foi convidado, por um grupo de teatro portuense, a acompanhar, enquanto jornalista, a sua participação num festival de teatro em Mindelo. “Achei que era maravilhoso, dado que tinha cancelado as minhas férias, aceitei e fui. E qual não foi a minha surpresa quando me puseram a dormir na residencial onde imaginei que o meu personagem tinha ficado em prisão domiciliária”. Muitas coincidências, mas faltava ainda uma. É que uma das sereias do livro “não tinha um dente da frente”. E, durante o festival, enquanto o jornalista fumava um cigarro no exterior, iniciou uma conversa com uma mindelense. “Quando ela sorriu, vi que não tinha o dente da frente”. Uma história que partilhou com o objectivo de provar que, efectivamente, “mais do que a imaginação, a literatura tem vindo a perverter a minha realidade”.
João Manuel Ribeiro substitui João de Melo, que não pôde comparecer, na mesa de debate. Depois de ler um poema de Eugénio de Andrade, explicou que “a Literatura é um território de paradoxos. O primeiro paradoxo tem a ver com a sua própria definição”. Mas, mesmo assim, avançou algumas definições. É, por exemplo, “experiência antropológica fundamental” ou elemento “que possibilita ver mais realidade porque inclui um conjunto de capacidades e de saberes. Dizem alguns que a literatura é uma forma distinta de aceder e possibilitar conhecimento ou de ver através da realidade”, continuou. “A Literatura não cria imaginação, mas cria realidade. A Literatura perverte a imaginação porque faz dela realidade”.
“Até este momento ainda não sei o que dizer”. A aflição de Malangatana depressa foi substituída pelas muitas histórias que guarda. “Alguém me perguntou como inventava figuras tortas, figuras tristes, figuras grandes. Eu disse que o invento aparece por mentira. É preciso mesmo que o pintor minta para poder perverter a sociedade”.
Verdadeiras ou ficcionais, ou como ele disse “mentira de verdade”, contou histórias e até cantou. E deixou uma forte mensagem no final. “A minha pintura, a minha obra, o que eu crio, não passa de tentar escrever poemas, pintando, pondo a cor, e mentira para que a sociedade se possa ver dentro dessas pinturas que também, de vez em quando, chamo poemas”.
Amanhã termina o Correntes d’Escritas. Não perca a oportunidade de assistir às últimas duas mesas de debate, no Auditório Municipal, às 10h30 e às 16h00.



Casas Contadas; História com recadinho e Derrocada. Público conheceu mais três obras

A Casa da Juventude acolheu, esta tarde, o lançamento de mais três obras literárias: Casas Contadas; História com recadinho e Derrocada.
Inês Pedrosa apresentou a autora, Leonor Xavier, e o seu mais recente livro, Casas Contadas. Recordando a mesa em que foi moderadora ontem à tarde, onde Manuel da Silva Ramos, munido de luz e capacete “tornou-se um mineiro”, Inês Pedrosa considerou a obra de Leonor Xavier “uma mina com várias galerias” e com uma “escrita sedutora, mas não manipuladora e com um ritmo musical fortíssimo”. Casas Contadas percorre todas as treze moradas da escritora ao longo da sua vida, cinco das quais no Brasil. Ao longo do livro, Leonor Xavier conta, não só a sua própria história, como também a história dos dois países onde habitou, Portugal e Brasil. A autora referiu que “todas as vidas têm história, por isso, todas as vidas davam livros”.
Vítor Silva Mota, da Editora Asa, explicou que a História com recadinho veio juntar-se a outras obras de Luísa Dacosta na Biblioteca Completa da escritora que a editora tem vindo a publicar. Luísa Dacosta, antes de qualquer outra coisa, levantou-se e advertiu: “fui professora toda a vida e só consigo falar de pé!” E foi de pé que folheou, orgulhosamente, a reedição da sua história (a primeira edição é de 1986). “Mesmo que depois fale menos”, brincou, “tenho que vos mostrar as ilustrações da Cristina Valadas, que é uma grande pintora, e que fez este trabalho maravilhoso”. Aquando da primeira edição, a História com recadinho mereceu uma crítica pouco positiva de uma revista. Luísa Dacosta ficou “bastante desiludida com essa injustiça” e, hoje à tarde, manifestou o seu desagrado, “até porque”, recordou, “recebi uma carta de um menino, na altura, que dizia: Luísa, gosto muito de ti. A História com recadinho é uma história de sonho e liberdade que nos faz sonhar”. Uma bruxinha decide fugir do reino das bruxas (um «mundo de trevas, árvores mortas e aves agoirentas») para o mundo dos homens (onde havia «tantos brilhos, tantas cores e tantos perfumes»), numa tentativa de encontrar um local onde pudesse «dar largas à sua alegria e ao seu humor benfazejo». Mas, para seu espanto, também o mundo dos homens, apesar da sua beleza exterior, se revelou um mundo de trevas pelo obscurantismo dos seus preconceitos!


Finalmente, Manuel Valente apresentou Ricardo Menéndez Salmón. O editor sublinhou que “se há escritores que me dão prazer apresentar, o Ricardo é um deles. Em Espanha é já considerado como um dos autores mais importantes do país”. Quanto à obra, o editor explicou que faz parte de uma “trilogia do Mal”. Ricardo Menéndez Salmón acabou por informou que “neste segundo livro da trilogia uma terrível ameaça recai sobre Promenadia, uma pacata cidade costeira”. Um assassino em série, que seduz vítimas e verdugos, actores e espectadores, transforma-se na sombra da comunidade. Os pilares de uma sociedade de escassos valores são infectados pela chaga do Terror – um prenúncio da derrocada – a que ninguém, nem mesmo Manila, o cismático polícia encarregado da investigação dos vários crimes, fica imune.

6ª mesa do Correntes reuniu “predadores”

INFOPÓVOA / PÓVOA DE VARZIM
“O poeta é o gourmet do recôndito.” esta foi a afirmação de Inma Luna que marcou a 6ª mesa do Correntes, ontem pela tarde, no Auditório Municipal. Moderada por Francisco José Viegas e tendo como ponto de partida a frase de Agustina Bessa-Luís “O poeta é um predador”, a sessão reuniu à mesma mesa Inma Luna, Ivo Machado, Jorge Melícias, Tiago Nené e valter hugo mãe.
Inma Luna revelou ao público que fez questão de levar um vestido com um leão para sentir na pele o papel de predador conforme a temática da sessão lhe sugeria abordar “O poeta é um predador”. “O poeta não sabe que é poeta até comer o primeiro pedaço de carne viva.” foi deste modo que Inma Luna iniciou o seu discurso e recorrendo a uma espécie de analogia zoopoética identificou o poeta lobo, o poeta crocodilo, o poeta anémona e o poeta serpente. Depois de caracterizar cada um destes poetas, a escritora alertou que não nos devemos esquecer que os poetas, como a imensa maioria dos predadores, estão em perigo de extinção, intimidados pelo mercado e suas condicionantes e desanimados pela desvalorização do sonhador acrescentando que o desaparecimento de uma espécie supõe que esse nicho ecológico seja imediatamente ocupado por outro, como por exemplo burocratas, banqueiros, políticos e dirigentes. No entanto, Inma Luna considera que a poesia segue querendo mudar a vida e para fazê-lo, o poeta seguirá devorando-a, aplicando-lhe as suas tácticas de atracção. A escritora terminou dizendo que “A predação tem uma função muito importante na natureza, por meio dela controla-se a povoação. O poeta, como predador, deveria contar com um tipo especial de protecção, devia ser tratado com mimo, prestigiar a sua tarefa, dar valor ao seu mordisco”.
Jorge Melícias afirmou que “a poesia é sempre uma encenação da verdade”, motivo pelo qual “tanta coisa é desculpada aos poetas”. O escritor não se considera um poeta místico, revelando que “sempre encontrei mais poesia na tosse dos tísicos do que nas chagas dos justos”, vendo a sensibilidade do lado do predador e não da presa. Jorge Melícias referiu ainda um real transmudado em que o poeta é um predador dele mesmo numa constante luta contra os seus próprios demónios, “o poeta é o predador de um real”, acrescentou. “Procuro que cada poema meu seja uma dádiva de pura violência”, disse o escritor que pensa que “a beleza está cada vez mais ligada à violência”.
Valter Hugo Mae assumiu-se como um predador e referiu que “ando sobretudo à caça da satisfação”, “falta-me tempo, quero mais”, “quero ser feliz no meio de tanta coisa”. Destas revelações, o escritor vilacondense partilhou a sua «história com os bichos» e o modo como se habituou a pensar tragicamente que os bichos eram capazes de sobreviver à sua ausência. Num registo irónico, valter hugo mãe confessou “sou um predador à caça de amigos por mais esquisitos que eles possam parecer. Eu sou um predador disto, o outro lado das coisas.”

Tiago Nené considera que “mais do que um predador, o poeta é um performer” e a poesia uma performance que ultrapassa a realidade. O poeta como predador absoluto é aquele que à distância segue a ordem do seu poema, na busca pela naturalidade, continuou o escritor que pensa que “o poeta não tem que dizer a verdade. A ficção como parte de uma realidade parte do contexto biográfico do poeta”. Tiago Nené disse que não existe uma definição exacta de poeta, “os poetas desejam desejos (dissecação de desejos) e é a partir desses contextos em que o poeta se auto-coloca que surge a poesia”, esclareceu acrescentando que “a boa poesia está acima da importância de existir”.



Ivo Machado começou por partilhar com o público a história sobre o primeiro poema que escreveu, dirigido à namorada, e que após o ter entregue só voltou a vê-la 35 anos depois. O escritor referiu algumas das “inesgotáveis definições de poeta” que o marcaram ao longo da vida entre as quais citou um poeta francês que dizia “Se perguntarem a um camponês grego o que é um poeta ele dirá que é aquele que canta, mas se o perguntarem a um homem culto da cidade ele dirá que é aquele que escreve versos”. “A poesia, na sua essência, é subversiva. O poeta proclama e subverte, outras vezes, prefere fechar os olhos para ver mais claro” afirmou o escritor que define o poeta como um recordador infatigável que fala aos mendigos e aos loucos, fala a todos que o queiram escutar e “poderá ser também um ajudante de Deus. Ivo Machado disse ainda que os governantes procuram silenciar os poetas mas citam-nos e “qualquer político sabe que uma só palavra pode matar a nossa sede” mas “quando se é poeta, há que aceitar ser ingénuo”, concluiu.

“Aceitem o desafio. Ponham todos os ovos no mesmo cesto.”

INFOPÓVOA / PÓVOA DE VARZIM

Imma Monsó apresentou, hoje ao final da manhã, na Casa da Juventude, a obra Um Homem de Palavra. Há alguns anos, a escritora perdeu o marido, pessoa com quem tinha “uma relação muito especial, não só física e amorosa, mas intelectual. Quando ele morreu comecei a escrever um diário. Só mais tarde percebi que estava diante de um livro”, confessou a escritora. “A distância da experiência, que parecia tão trágica, fez-me perceber que aquele acontecimento foi um entre os vários momentos infelizes da nossa vida”, descreveu Imma Monsó. Em Um Homem de Palavra, desafio o leitor a colocar todos os ovos no mesmo cesto, a viver plenamente a paixão, mas para estar preparado para que o cesto caia e os ovos se partam. Afinal, quando um ser querido desaparece da nova vida, como conciliar a necessidade de esquecer com o forte desejo de nunca o fazer? Como conjugar a recordação e o esquecimento da melhor maneira possível? Descubra as respostas em Um Homem de Palavra, um singular tratado sobre o luto e uma tentativa de reconstruir a presença do ser desaparecido por meio de palavras e de humor, as únicas formas que podem ganhar a partida à morte.

O Universo infinito das palavras em discussão na 5ª mesa de debate


INFOPÓVOA / PÓVOA DE VARZIM
Não foi a palavra mas sim o tema que cercou os cinco convidados de hoje para a 5ª mesa de debate. “As palavras cercam-nos como um muro” foi o mote para uma conversa animada, ou não tivesse como moderador Onésimo Teotónio de Almeida, escritor açoriano que tem sempre uma anedota na ponta da língua.
“Creio que as palavras não têm culpa. São inocentes. São as palavras que estão encerradas no crânio juntamente com os pensamentos e as sensações”, começou por dizer Hector Abad Faciolince. Palavras essas que podem escapar pela boca ou pela escrita. “O ser humano inventou outra porta para que as palavras escapassem do crânio, sem serem ouvidas. Esse invento foi a escrita. Porque há dois tipos de palavras, as sonoras e as palavras silenciosas, as que escrevemos. É como um sopro nos dedos, um rumor apenas perceptível na pena que desliza sobre o papel”. E é com estas palavras mudas que o escritor colombiano se sente mais à vontade, “cómodo, livre”. É que quando escreve, ninguém o interrompe ou critica, “não gaguejo, não titubeio”.
Inês Botelho acredita que “quer na fala quer na escrita o vocabulário restringe-nos”, sendo que a linguagem nos cerca praticamente “desde o útero, onde somos bombardeados pelos sons”. “A linguagem está em todo o lado, vai-nos moldando e penetrando”. Por outro lado, Inês Botelho defende que “há alturas em que os textos parecem exigir que os escreva”, as palavras rodeiam-na “ e sou eu a querer agarrá-las”. “As palavras são tantas que tendem a sair numa enxurrada violenta” e, por isso, a escritora depara-se com uma página em branco “sem saber como escrever a maldita primeira frase”. E se “culpar a linguagem é inútil” a verdade é que “as palavras são quase inevitáveis, mas preciosas e imensas. Afinal, podemos fazer tanto com as palavras que nos cercam”.
A catalã Imma Monsó escolheu falar do tema através da sua relação com a palavra, desenvolvida ao longo dos livros que já escreveu. Assim, atribui à Literatura a possibilidade de “entrar num mundo mágico de empatia com o outro, de entrar na mente de outra pessoa, viver a sua vida”. De certa forma, a palavra permite a evasão, a construção de alternativas. Permite também derrubar muros, “inovar continuamente”, construir personagens “que são vistas de forma distinta pelos leitores”. A palavra pode ainda “derrubar tabus”, funcionar como “terapia” e “redimensionar e pôr na medida justa os problemas pessoais”, este último conclusão a que chegou com o livro Um Homem de Palavra, nascido de um diário que escreveu após a morte súbita do seu companheiro. “As palavras são muros que nos cercam, mas que também derrubam e que nos transformam, nos alegram e nos entristecem”.
A José Carlos Barros a descoberta das palavras e da Literatura é indissociável da sua infância, “um lugar mágico”. Nascido num meio rural, no interior, “lugar onde o sobrenatural convivia com o quotidiano”, contou que os habitantes, mesmo analfabetos, sem escolaridade e sem livros, davam muita importância às palavras e aos livros. “Nos negócios diziam ‘Dou-te a minha palavra’” e respeitavam a palavra escrita que vinha nos livros dos “doutores”. “A maneira como vejo a Literatura e como escrevo tem a ver com, por um lado, com esta ideia de mundo mágico, em que a Literatura permite a reconstrução de memórias e de criação de universos únicos, e, por outro lado com a importância da palavra”.
“O tema é provocante, tem vários pontos de fuga. Podia falar, por exemplo, sobre a liberdade de expressão, mas se calhar iríamos ficar aqui até às três da tarde”. Por isso, Pedro Pinto, o último interveniente nesta 5ª mesa de debate, optou por identificar os diversos muros com que se deparou na escrita do seu romance estreia O Último Bandeirante. Escrever sem ter objectivamente uma ideia, lidar com o conflito de interesses por detrás da história de Raposo Tavares, o último bandeirante, equilibrar os momentos de angústia com os momentos de exaltação no processo criativo, imaginar os pormenores, os cenários foram apenas alguns das barreiras que o jornalista encontrou. “Mais do que cercarem, e pegando numa música dos Xutos & Pontapés, as palavras erguem escadas e partem muros”. Por isso, e concordando com Hector Abad Faciolince, Pedro Pinto defendeu “que a culpa não é das palavras, é dos muros que criamos às nossas próprias palavras”.

Inês Pedrosa, Leonor Xavier, Manuel Rui e Pablo Ramos partilharam palavras com alunos da Escola Rocha Peixoto

INFOPÓVOA / PÓVOA DE VARZIM
Inês Pedrosa, Leonor Xavier, Manuel Rui e Pablo Ramos estiveram, esta manhã, na Escola Secundária Rocha Peixoto transportando as Correntes d’Escritas ao meio escolar.
Leonor Xavier dirigiu-se para uma plateia de cerca de 150 alunos, dizendo “gosto muito de vocês” e acrescentou que no mundo em que vivemos poder dizer alguma coisa a alguém é absolutamente fantástico. Recorrendo a um verso de Carlos Drummond de Andrade “amar aprende-se amando”, a escritora referiu que viver também se aprende vivendo pelo que considera que “não andamos nesta vida por acaso e há um sentido para andarmos por aqui”. Como palavra de eleição, Leonor Xavier revelou que anda muito fixada na palavra “pessoa”, “mexe muito comigo” e fá-la reflectir em questões como “Porquê que certas pessoas passam na nossa vida?” ou “O que é que as pessoas nos deixam na vida?”. Ainda a propósito das palavras, a escritora citou alguns amigos que diziam “As palavras são como plasticina porque podemos moldá-las” e “Todos os dias temos que levar palavras novas para casa”, confessando que “acho bonito que as palavras sejam um pouco de nós”.
Sobre a sua obra, Casas Contadas, que será apresentada esta tarde na Casa da Juventude, Leonor Xavier afirmou que se trata de uma autobiografia, em que cada capítulo corresponde a uma das casas onde viveu, no total 13, cinco delas no Brasil, acrescentando que as casas foram um pretexto para contar a sua vida.
Inês Pedrosa partilhou com o público que a sua ligação aos livros e à escrita começou muito cedo “a literatura é que me envergou a mim, ainda muito pequenina” e nunca pensou em desistir de escrever, vivendo sempre “na rede das palavras”. Questionada sobre planos para o futuro, a escritora disse que “não sou de fazer projectos”, apenas “tenho sempre outro livro na cabeça quando termino um” e neste momento pensa no seu próximo lançamento que será em Abril. Sobre a dicotomia ficção/realidade, Inês Pedrosa afirmou que “Tenho cada vez mais dificuldade em distinguir a realidade da imaginação. A realidade é assombrosa e muito inspiradora; a ficção é a transfiguração da realidade.”


“Escrever é a coisa mais profunda que se faz na vida. Quando não escrevo não sou nada.” declarou Pablo Ramos para quem a escrita é um trabalho espiritual. O escritor argentino define-se como um “escritor moral” e justifica dizendo que escreve histórias nas quais as personagens têm que se confrontar e decidir porque, para si, “uma narrativa de qualidade é sempre moral” porque a própria vida é uma “aventura moral”. “A minha literatura é profundamente social” e retrata uma “realidade que me toca profundamente e se apresenta na minha ficção de modo estruturado”, numa mescla de místico e compromisso político e social, acrescentou Pablo Ramos.
A propósito de “A voz das Palavras”, Manuel Rui referiu que “as palavras só o são quando convivem umas com as outras” e lembrou que há palavras escritas e palavras ditas acrescentando que em relação às últimas “tem-se desperdiçado muito a voz”. O escritor angolano considera que “é preciso haver mais contacto directo entre as pessoas”.
Para além da partilha dos escritores, a sessão contou também com a actuação do coro da Escola Secundária Rocha Peixoto que presenteou os escritores com algumas músicas.

O Terceiro Reich, de Roberto Bolaño apresentado em festa

INFOPÓVOA / PÓVOA DE VARZIM
O Terceiro Reich, de Roberto Bolaño foi apresentado em festa, ontem, já depois da meia-noite, no Bar da Praia. Francisco José Viegas, da editora Quetzal, anunciou que “esta é a primeira tradução mundial do livro, o que é uma enorme honra para Portugal”.
Sobre o autor: Roberto Bolaño nasceu em 1953, em Santiago do Chile. Filho de pai camionista e de mãe professora, a sua infância foi vivida em várias cidades chilenas (Valparaíso, Quilpué, Viña del Mar ou Cauquenes) e a passagem pela escola foi atormentada pela dislexia. Aos quinze anos a família mudou-se para a Cidade do México. Durante a adolescência leu vorazmente, escreveu poesia - e abandonou os estudos para regressar ao Chile poucos dias antes do golpe que depôs Salvador Allende. Ligado a um grupo trotsquista, foi preso pelos militares e libertado algum tempo depois. De volta ao México, fundou com amigos o Infrarrealismo, um movimento literário punk-surrealista, que consistia na “provocação e no apelo às armas” contra o estabelecimento das letras latino-americanas e suas figuras de proa, de Octavio Paz a García Márquez. Nos anos setenta, Bolaño vagabundeou pela Europa - lavou pratos em restaurantes, trabalhou nas vindimas ou como guarda-nocturno de parques de campismo -, após o que se instalou em Espanha, na Costa Brava, com a mulher e os dois filhos. Aí, dedicou os últimos dez anos da sua vida à escrita. Fê-lo febrilmente, com urgência, até à morte (em Barcelona, em Julho de 2003), aos cinquenta anos.A sua herança literária é de uma grandeza ímpar, sendo considerado o mais importante escritor latino-americano da sua geração - e da actualidade. Entre outros prémios, como o Rómulo Gallegos ou o Herralde, Roberto Bolaño já não pôde receber o prestigiado National Book Critics Circle Award, o da Fundación Lara, o Salambó, o Ciudad de Barcelona, o Santiago de Chile ou o Altazor, atribuídos a 2666, unanimemente considerado o maior fenómeno literário da última década.

Sobre o livro: Há uma espécie de detective literário, personagens peculiares e um sem-fim de referências literárias — que darão muito gozo ao leitor. A saber: Udo Berger, que sempre quis ser um grande escritor, mas que tem de se conformar em ser o campeão de “jogos de estratégia & guerra em Stuttgart”, decide ir ao Hotel del Mar, na Costa Brava catalã, com a sua nova namorada, Ingeborg (nome de uma das personagens de 2666). O objectivo é treinar-se para participar num novo jogo de estratégia, justamente Terceiro Reich, e preparar-se para ganhar um torneio internacional. Eles compartilham suas férias com um outro casal alemão, Charlie e Hanna, até que o primeiro destes desaparece misteriosamente depois de se cruzar com dois sinistros personagens que também levantam suspeitas nas autoridades locais: «O Lobo» e «O Cordeiro». Entretanto, Udo Berger é perseguido por um detective estranho e sombrio e, atormentado por essa perseguição sem sentido, acaba por entrar em delírio com a “paisagem surreal da Costa Brava”. Tudo isto acontece quando entra num jogo de vida ou morte com um personagem enigmático e de rosto desfigurado, El Quemado. Uma autêntica sinfonia de literatura, política, divertimento surreal, absurdo. Gozo puro.
Escritores, editores e público, depois da apresentação, continuaram em grande festa.

Seis obras apresentadas no Correntes d'Escritas

INFOPÓVOA / PÓVOA DE VARZIM
Mais seis obras foram lançadas no Axis Vermar: Vozes no escuro, de Rui Vieira; Substâncias Perigosas, de Pedro Eiras; Desacordo Ortográfico, antologia VV.AA, Origem da tristeza, de Pablo Ramos; Cadáver precisa-se, de Milton Fornaro; e Receitas de amor para mulheres tristes, de Héctor Abad Faciolince.
Rui Vieira começou por afirmar que, agora que está publicado, “o livro já não é meu”. Vozes no escuro conta a história de uma noviça de dezassete anos que se interroga sobre a sua verdadeira vocação, isolada no castigo da cela de um convento durante seis dias, sentindo-se possuída pelos espíritos e pelas vozes das anteriores freiras que habitaram a mesma cela. O autor explicou que “as personagens não têm nome. Mais do que falar de freiras, quis que a personagem principal fosse a Mulher”.
Para Pedro Eiras, Substâncias Perigosas é “um respirar fundo, um desabafo, um ponto da situação, um resumo das minhas aulas e o que vocês quiserem”. O livro de Pedro Eiras tem como título completo Pequeno divertimento sobre literatura em cem lições também conhecido sob o título Substâncias Perigosas em que se explica por que meios os livros matam os seus autores e onde se dão variados e muito instrutivos exemplos ao alcance do comum dos mortais. A obra é um divertimento para quem escreveu e para quem lê, sobretudo aqueles apaixonados pelos livros que reconhecerão os poderes fatais dos objectos por quem nutrem tanta paixão.
A editora Livro do Dia, pela voz de Luís Filipe Cristóvão, lançou Desacordo Ortográfico, uma antologia de textos que valorizam a diferença na língua portuguesa. Autores portugueses, brasileiros, cabo-verdianos e moçambicanos reuniram-se para, mais do que escrever em bom português, escrever “boa literatura”. Um livro com textos de Altair Martins, Cardoso, Gonçalo M. Tavares, João Pedro Mésseder, Luandino Vieira, Luis Fernando Verissimo, Luís Filipe Cristóvão, Manoel de Barros, Marcelino Freire, Maria Valéria Rezende, Nelson Saúte, Olinda Beja, Ondjaki, Patrícia Portela, Patrícia Reis, Pepetela, Reginaldo Pujol Filho, Rita Taborda Duarte, Rogério Manjate e Xico Sá.

Pablo Ramos apresentou a sua Origem da tristeza. Segundo o autor, esta é uma obra de aventura onde se segue o crescimento de Gabriel. Neste romance, muito autobiográfico, Pablo Ramos exibe os seus extraordinários dotes de narrador através de uma escrita luminosa e precisa de ritmo apaixonante, que sabe que o humor é mais poderoso que a auto-compaixão e que a vida, se a deixarmos vibrar, abre caminhos mesmo onde estes não se vislumbram.
Milton Fornaro foi apresentado pelo poeta Ivo Machado que leu a edição uruguaia há quatro anos. “Como sou um homem prevenido e guardo todos os meus emails, trouxe a mensagem que enviei ao Milton depois de ter lido a sua obra”, explicou o escritor açoriano. Ivo Machado considera Cadáver precisa-se “uma obra desconcertante, magnífica”.
E foi com muito sentido de humor que Héctor Abad Faciolince apresentou Receitas de amor para mulheres tristes. O escritor contou que a história foi rejeitada por nove editoras, antes de ser publicada pela sua namorada. Depois de sofrer de fortes cólicas biliares que, segundo Héctor Abad Faciolince são frequentes em mulheres que já tiveram muitos filhos, o autor sentia-se “uma mulher muito triste”. "Receitas" em belíssimos textos, traduzidos pelo poeta Pedro Tamen, para ajudar à cura dos "males de que padecem as mulheres, ou a identidade feminina", que vão da infelicidade à traição, à frigidez, ao receio de ficar velha, ao nervosismo, ao medo das sogras, ao mau hálito, através de uma sabedoria que vem de trás e que conhece o "feminino" em profundidade. Isto apesar de o autor ser um homem. Mas que teve cinco irmãs, ou seis mães, como ele diz, e a quem dedica esta obra.

“Euro, a Nossa Moeda”: exposição patente na Casa da Juventude de 2 a 13 de Março


INFOPÓVOA / PÓVOA DE VARZIM
De 2 a 13 de Março, o Investemais traz à Póvoa de Varzim a exposição “Euro, a Nossa Moeda”. A Casa da Juventude foi o espaço escolhido para acolher a mostra, que já esteve patente em diversas cidades portugueses, organizada pela Representação da Comissão Europeia em Portugal e pelo Centro de Informação Europe Direct de Entre Douro e Minho. Esta iniciativa pretende destacar os benefícios da existência da moeda única e as oportunidades que oferece à economia e aos cidadãos, os aspectos fundamentais do Pacto de Estabilidade e Convergência e o impacto da moeda única nos preços. A exposição é composta por vários painéis, apresentando informação sobre o processo de criação da moeda única europeia e sobre a União Económica e Monetária, bem como informação específica sobre as características das notas e moedas, de interesse para o público em geral e para as crianças e jovens em particular.
Para marcações de visitas guiadas a escolas do ensino básico e secundário deverá contactar o Investemais através do número de telefone 252 090193 ou do correio electrónico
investemais@cm-pvarzim.pt.
Relembramos que o Investemais é um serviço criado pela Câmara Municipal em 2008 com o objectivo de colaborar com as empresas locais, prestar informação sobre legislação, formalidades, apoios e contactos e estabelecer relacionamentos entre empresários e diversas entidades públicas e privadas representativas dos diversos sectores de actividade.

O Medo e a Inveja no Correntes d’Escritas – novos livros apresentados


INFOPÓVOA / PÓVOA DE VARZIM
Entre duas mesas de debate, o Correntes d’Escritas foi casa para o lançamento de dois novos livros. O País do Medo, de Isaac Rosa, e Inveja – Mal Secreto, de Zuenir Ventura, chegaram à Póvoa pela mão da editora Planeta.
João Tordo apresentou o livro daquele que é considerado “um dos mais promissores romancistas espanhóis”, Isaac Rosa. O País do Medo, contou João tordo, “baseia-se na história de uma família, pai, mãe e filho, tendo com pano de fundo a temática do medo”. Isto porque, após o nascimento do filho, o pai viu-se a braços com o medo “de tudo o que está à sua volta”. Escrito na terceira pessoa, o livro tem, na opinião de João Tordo, um outro elemento muito curioso: a cobardia do protagonista. “O protagonista é um anti-herói, tem medo de tudo, das coisas mais mundanas”.
Explicou Isaac Rosa que com este livro pretendeu fazer um “reflexo do medo, que se converteu num elemento dominante nas sociedades, derivado dos acontecimentos do 11 de Setembro, o que levou a tempos de mudança e de crise”.
Do Brasil, Zuenir Ventura trouxe Inveja – Mal Secreto. José Carlos de Vasconcelos, na apresentação da obra, anunciou que este livro faz parte de uma colecção sobre os pecados mortais. “É sobretudo um livro sobre alguém que está a fazer um livro sobre o pecado da inveja” e, na sua escrita, o autor juntou reportagem, ficção, pesquisa e até o género policial.


“Todo o mundo tem inveja”, contou o autor brasileiro, “é um pecado que já existia no Paraíso. A inveja atinge todos os níveis, todas as classes. E começa por atingir aqueles que nos estão próximos”. Sobre a estrutura da obra, a utilização de vários géneros e até o facto de escrever sobre alguém que está a escrever sobre a inveja prendeu-se com o facto de Zuenir Ventura não ter encontrado uma personagem para o seu livro. Explicou ele que a inveja é de facto um mal secreto, que poucos assumem. “Como ia inventar uma personagem se não encontrava nenhum invejoso?”, questionou, avançando ainda que está já preparar uma nova obra, desta feita sobre a sua família.
Palco do lançamento de mais de 20 livros este ano, o Correntes d’Escritas alberga também uma Feira do Livro onde todas estas novidades podem ser adquiridas. Fica na Casa da Juventude e vale bem a pena a visita.
Para saber quais os próximos lançamentos, visite o programa do Encontro de Escritores de Expressão Ibérica no
portal municipal.

“Literatura: o esforço inédito das palavras” encerra segundo dia de debates

INFOPÓVOA / PÓVOA DE VARZIM
De capacete e lanterna na cabeça, Manuel da Silva Ramos surpreendeu a audiência. Afinal, todos estavam ali para ouvir o debate sobre “Literatura: o esforço inédito das palavras”, moderado por Inês Pedrosa, e no qual participavam também J.J. Armas Marcelo, Luís Naves, Pablo Ramos e Paulo Kellerman.
Mas Manuel da Silva Ramos era agora mineiro, ou melhor, prospector. E na sua mina, em que já trabalha há muitos anos, “é preciso ter muita imaginação, porque há gente que diz que a mina não existe”. Mesmo assim, o escritor recusa dizer onde ela está, porque também não sabe. É que, explica ele “salto da mina para a vida e pronto”. O corredor, “cheio de material inédito”, é o corredor da “infinita emoção”. “No outro dia apanhei uma palavra de 15 quilates de emoção, era uma das mais belas palavras que já vira”, contou, descrevendo que, na sua mina, existem várias galerias: o da poesia bruta, “que não é difícil”, a galeria da política, onde “o trabalho é escravo mas o meu prazer é enorme”, a galeria da dor, onde transforma e escava “sobre a alegria que vem a seguir”, a galeria, mesmo junto à entrada, “a mais frequentada mas a mais difícil de trabalhar”, a galeria da imaginação, “que me é muito cara” e onde tem “os olhos virados para as coisas invisíveis”, a mina erudita, “a que é mais inimiga dos prospectores. Mata a mina da nossa emoção”…
Uma intervenção criativa a que se seguiu Paulo Kellerman, contista português que avançou ter chegado à conclusão que “talvez o tema esteja errado”, pois, em vez de “o esforço inédito das palavras”, prefere “esforço partilhado das palavras”. Uma alteração que remete, desde logo, para a relação entre escritor e leitor.
“As minhas histórias partem de imagens. Estas revelam indícios”, disse, tentando definir o que é escrever. “Talvez seja olhar a realidade e desmontá-la”, arriscou, acrescentando ainda que, na sua opinião, a Literatura é também a “arte da curiosidade, sobre o que somos, o que sentimos ou até sobre o que poderíamos ser e sentir”. As palavras são assim aquilo que proporciona individualidade ao escritor, “é a palavra que nos distingue”.
Pablo Ramos contou que começou a escrever ficção “por um fracasso”. De facto, nascido de uma família de músicos, cedo começou a aprender esta arte. Frustrado com os seus pobres resultados, começou a escrever um diário, mas onde descrevia o oposto da sua vida. Assim, Pablo Ramos tinha um futuro extraordinário como músico pela frente, o seu pai era rico e, em vez dos quatro irmãos que tinha na realidade, era filho único. “O que é estranho é que a minha mãe era exactamente igual. E uso todo este contexto para dizer que, para mim, não existe esforço inédito. Existe sim o enorme esforço de espírito do escritor”. Um esforço sem o qual não há Literatura, segundo Pablo Ramos. “A facilidade da palavra não é Literatura”.
J.J. Armas Marcelo já habituou o Correntes ao seu humor. Considerando este um daqueles temas em que tanto se pode dizer nada, como encher inúmeras páginas, o escritor e jornalista espanhol foi contando várias histórias, num crescendo de gargalhas que varreu o Auditório Municipal, como forma de ilustrar o quão complicada é a palavra para o escritor e também as dúvidas que a própria profissão de escritor levanta. Pior isso, quando lhe perguntaram o que fazia respondeu “O meu trabalho é discutir com as palavras”. Um trabalho que obriga a “descobrir o lado secreto das palavras”, um esforço que é marca dos grandes escritores. “Situar as palavras é o esforço de convertê-las em inédito”.


Luís Naves, “agente infiltrado”, como se identificou, atirou a pergunta “Como é que o esforço da escrita é lida pela sociedade?”, encaminhado o debate para o campo de como é que o escritor é visto. “Muito mal”, considerou, lembrando que há mais futebolistas profissionais em Portugal que escritores, uma “classe mal vista” pela sociedade. Mais do que esforço inédito, falou de “sede”, ou melhor, do que considera ser importante para o escritor, apontado logo as vivências. “Os escritores vão melhorando ao longo do tempo, porque as vivências transforma as pessoas. Dou também muita importância à realidade, porque é muito complicada”, afirmou, pois, considera, “se não vivermos as coisas não podemos escrever sobre elas”.
Correntes d’Escritas continua amanhã os debates com uma mesa de manhã, às
10h30, e outras duas à tarde, às 15h00 e às 17h30.
Para saber mais pormenores, visite o portal municipal em
www.cm-pvarzim.pt

Três novos projectos apresentados no Correntes d'Escritas

Ler por aí…

INFOPÓVOA / PÓVOA DE VARZIM
Uma das novidades desta 11ª edição do Correntes d'Escritas é o espaço para apresentação de novos projectos. Ontem à noite, no Axis Vermar, o público ficou a conhecer Ler por aí…; O Rato da Europa e PNETliteratura. Margarida Branco é a autora do sítio electrónico Ler por aí… Um espaço com sugestões de leitura nos lugares das histórias. Ao ler um livro cujo cenário é o lugar em que se está, esse lugar ganha vida, povoa-se das personagens da história e testemunhamos o desenrolar da acção com os nossos cinco sentidos. A intimidade com as personagens cresce para nunca mais as esquecermos. É isto Ler por aí... Pretende dar informação sobre que livro ou livros Ler por aí..., ou seja, levar para ler quando se viaja ou passeia (antes, durante, depois). Margarida Branco explicou que “quando procuramos informações sobre um local encontramos dados sobre onde dormir, onde comer, o que fazer, mas nunca o que ler”.

PNETliteratura

O PNETliteratura existe desde 2008. Vários escritores de língua portuguesa colaboram no sítio electrónico regularmente, como é o caso de Gonçalo M. Tavares, Almeida Faria, Casimiro de Brito, Vasco Graça Moura, valter hugo mãe, Manuela Degerine, Ondjaki (de Angola), Nelson Saúte (de Moçambique) e Patrícia Melo, Carlos Pessa Rosa e Eustáquio Gomes (Brasil).
Uma vasta rede de correspondentes vai, de modo contínuo, e com grande regularidade, dando conta de eventos literários relevantes. Kátia Gerlach, em Nova Iorque, Vanessa Godinho, em Luanda, Ana Maria Delgado, em Washington DC, Manuela Degerine, em Paris, Sílvia Chueire, no Rio de Janeiro e Susana Leite, em Leipzig.
A par das áreas fundamentais abraçadas pelo PNETliteratura e das secções específicas de informação ("Curtas & Eventos"), são ainda de realçar o Literanário (que permite acolher jovens escritores e novas escritas), rubricas como as Mini-entrevistas, Destaques na rede, as Pré-publicações e o Folhetim dos fins-de-semana, para além dos Dossiês Especiais e de secções ligadas à Literatura Popular. O sítio conta com a visita diária de 1500 cibernautas e recomenda-se.
O Rato da Europa



Finalmente, foi apresentado o projecto O Rato da Europa, uma colecção de textos inéditos, editada pela Pé de Mosca, onde se desenvolverá, através dos mais variados géneros, ângulos de abordagem e pontos de vista, uma reflexão alargada sobre o binómio Portugal/Europa. Boomerang, de Pedro Eiras, é o primeiro número da colecção, recentemente publicado, correspondendo a um conjunto de 27 postais sobre representações da Europa na literatura portuguesa dos séculos XIX a XXI. Os próximos números, a lançar brevemente, serão da autoria de Régis Salado, que tratará das representações de Portugal na literatura europeia, e de Regina Guimarães. O Rato da Europa espera, assim, poder contribuir para repensar a tradição do velho continente, numa época em que urge debater os futuros da União Europeia.