sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Correntes d’Escritas – exibição de documentários, às 21h45


Infopóvoa / Póvoa de Varzim
O cinema também faz parte da programação do Correntes d’Escritas e hoje pelas 21h45 serão exibidos dois documentários, no Auditório Municipal, “Toma lá do O’Neill”, de Fernando Lopes e “José Cardoso Pires – livro de bordo”, de Manuel Mozos.
“Toma lá do O’Neill” é um tributo pessoal e não uma biografia, muito menos uma análise crítica da obra poética de Alexandre O’Neill. Isso está feito e refeito. Trata-se, sobretudo, das vivências criativas, sentimentais e afectivas de um poeta, um dos maiores do nosso século XX.
Rodado em Lisboa e na Costa da Caparica no Outono e Inverno de 1997, “José Cardoso Pires – livro de bordo” trata temas como a vida e a escrita, o cinema, o erotismo e a morte. No ano em que José Cardoso Pires recebeu o Prémio Pessoa, o mais prestigiado prémio português, Manuel Mozos filmou o retrato daquele que foi um dos grandes autores de língua portuguesa.
Cada filme tem a duração de 52 minutos e o custo dos bilhetes é de 4 euros para o público em geral e 2 euros para sócios.
Esta sessão cinematográfica é organizada pelo Cineclube Octopus, associação cultural poveira que apoia o Correntes d’Escritas, e com a qual a Câmara Municipal estabeleceu um protocolo de colaboração criando-se, desta forma, as condições necessárias para uma abordagem permanente do fenómeno cinematográfico de uma perspectiva estritamente cultural.
No
portal municipal, pode acompanhar diariamente o Correntes d’Escritas e ficar a conhecer toda a programação do evento.


Versos de Alberto Caeiro em debate na 3ª mesa do Correntes d’Escritas, esta tarde

Infopóvoa / Póvoa de Varzim
“Passo e fico, como o Universo” foi o verso de Alberto Caeiro que deu mote à 3ª mesa que decorreu esta tarde no Auditório Municipal e reuniu Bernardo Carvalho, Germano Almeida, Isaac Rosa, João Tordo e Tânia Ganho e teve como moderador Carlos Vaz Marques.
Para Tânia Ganho, “O livro é uma parte de mim. Enquanto o objecto durar, eu fico.”, afirmou a escritora partilhando com o público que um dos momentos mais importantes da sua vida aconteceu no lançamento do seu primeiro livro quando uma rapariga de 19 anos lhe disse que o livro tinha mudado a sua vida. A escritora e tradutora considera que “os livros são vidas que se agarram a nós” e cada livro que publica é uma parte da sua vida que passa. À pergunta “Porquê que escreve?”, Tânia Ganho revelou que nunca teve uma resposta para ela pois “escrevo desde que sei escrever e escrevo porque é a minha maneira de estar. Tento escrever aquilo que quero, com convicção.” acrescentando que “escrever é uma espécie de esquizofrenia”. “Escrever é um pouco como ser encenador e actor” porque o acto de escrever implica pôr em palco uma acção e, simultaneamente, criar personagens e encarná-las, concluiu Tânia Ganho.
A propósito de outra passagem do mesmo poema de Caeiro que diz “Esse é o destino dos versos./ Escrevi-os e devo mostrá-los a todos”, João Tordo considera que hoje em dia vivemos numa dicotomia entre o escritor que não se quer mostrar e aquele que escreve para os leitores e esta marca a diferença entre literatura erudita e literatura comercial. O escritor encara como uma falácia os escritores que rejeitam o sucesso e dizem que escrevem para si próprios. E recorrendo a outros versos do mesmo poema “Quem sabe quem os terá?/ Quem sabe a que mãos irão?”, João Tordo referiu que estes exprimem a alegria e drama de quem escreve pois “a ambição do romancista é mudar o ponto de vista de quem lê”. O escritor expressou que o poema de Alberto Caeiro remete para a interioridade de quem escreve e disse que “os livros deixam de ser nossos quando são publicados mas também são nossos porque resgatamos as pessoas ou personagens da morte mantendo-as nas nossas páginas”. João Tordo terminou dizendo que a literatura é parte de uma raiz que é a “raiz do mal”, à qual se submete e “sinto-me quase alegre”.
À semelhança de João Tordo, Isaac Rosa também escolheu o verso “Quem sabe quem os terá?” para reflectir sobre quem são os destinatários daquilo que o escritor produz. “Os poetas têm destinatários porque podem dedicar os seus versos a quem entenderem mas os romancistas, normalmente, não pensam nos destinatários porque escrevem para si mesmos e alguns pensam nos compradores de livros” afirmou o escritor espanhol. Como leitor, Isaac Rosa considera que ao ler um romance pensa que o autor não sabe que ele existe e isto preocupa-o enquanto escritor porque reconhece que existe um leitor inteligente. “Os meus romances nascem da consciência de que existem leitores inteligentes, que têm uma participação no livro” declarou o escritor manifestando o seu sentido de responsabilidade “tento ter uma escrita responsável. O escritor deve ser consciente”.
Para Bernardo Coelho, toda a produção artística e literária é feita com a consciência de que “passa e não fica”, ou seja, tem uma opinião contrária àquela que o verso exprime “Passo e fico”. O escritor considera que o poema de Alberto Caeiro associa o poeta à natureza, encarando o poema como uma paisagem, com naturalidade, ideia que para si é terrível pois “literatura é singularidade, é limite”.

Começando por referir o embaraço em abordar o verso de Caeiro, que aliás foi comum a todos os escritores da mesa, Germano Almeida decidiu encará-lo como uma questão “Passo ou fico?” à qual responde “Não acredito que passo e fico.”. O escritor revelou que não acredita na imortalidade e referiu que através da escrita estabelece uma relação de divertimento com os leitores que lhe pedem para escrever porque precisam de dar umas gargalhadas. “Escrevo para me divertir e se me divertindo divirto os leitores, é uma enorme satisfação” conclui Germano Almeida que confessou que “Só escrevo quando me apetece escrever, quando tenho uma história para contar e descobri a forma como a escrever. Se tenho uma história conto, se não tenho não me ralo”.

Chega de Fado e Histórias do Barco da Velha lançados no final da manhã


Infopóvoa / Póvoa de Varzim
A manhã do segundo dia do Correntes d'Escritas terminou com a apresentação, na Casa da Juventude, de Chega de Fado, de Paulo Kellerman, e Histórias do Barco da Velha, de Pedro Teixeira Neves.
Paulo Kellerman participa no Encontro de Escritores pela primeira vez. Afirma que escolheu uma “estranha forma de literatura: sou contista”, assume. Neste livro “coloco questões. Questiono as minhas certezas e pretendo que o leitor questione as suas”. O autor define esta obra como sendo “um catálogo de possibilidades, de alternativas”. “Escrevo sobre os relacionamentos humanos” e quanto às vinte personagens que Paulo Kellerman criou para este livro “caracterizam as faltas de investimento nas relações, o conformismo, a apatia”, explicou o autor. Nasce, assim, uma radiografia desapaixonada e incisiva do quotidiano, um retrato cru dos gestos e dos silêncios, das banalidades e das frustrações, das esperanças e dos secretismos que atravessam as relações e caracterizam a precariedade e imprevisibilidade dos comportamentos e sentimentos de todos nós. Mas, a certa altura, as personagens têm vontade de gritar “chega desta lamúria, Chega de Fado”.
Pedro Teixeira Neves escreveu e Rute Reimão ilustrou. Histórias do Barco da Velha é um livro infantil onde as personagens vivem situações bizarras. Para o autor, o resultado final é “fantástico. O livro merece esta dignidade. O trabalho da Rute parece que quer sair do papel e a conjugação entre a escrita e a ilustração tornam os livros infantis pequenas obras de arte”. Pedro Teixeira Neves confessou que “se para mim, que sou daltónico e vejo o mundo todo verde, o trabalho da Rute está incrível, imagino para vocês”.
Rute Reimão contou que “adoro sujar as mãos. Apesar de trabalhar com o computador diariamente, pois também sou designer gráfica, recuso-me a fazer ilustrações no computador”. A ilustradora comentou que “o meu ateliê parece um ferro-velho, mas ainda sem o ferro. Estou sempre à procura de botões, de rendas, de novos materiais para os livros”.
Os lançamentos no Correntes d'Escritas continuam hoje à tarde, às 17h00, na Casa da Juventude, com Isaac Rosa, com O País do Medo, e Zuenir Ventura, com Inveja – Mal Secreto”.

Pedra, palavra, verso, poema na segunda mesa de debate

Infopóvoa / Póvoa de Varzim
Pedra a pedra, constrói-se a poesia. Este foi o tema de mesa de debate desta manhã, no Auditório Municipal, e que contou com as intervenções de Manuel Rui, Maria Teresa Horta, Pedro Teixeira Neves, Rosa Alice Branco, Tiago Gomes e com José Carlos de Vasconcelos na moderação.
Dedicando o seu texto ao povo madeirense, Manuel Rui considera que “as palavras também sofrem como as colinas que se fazem explodir, para se diminuírem pedra a pedra”, transformando-se numa “estátua de palavras mudas”. “Também ficam operárias como as mãos, pedra a pedra, na arte anónima das calçadas, para pisar, palavra a palavra”, dizendo, no entanto, que “nunca terei arte para lapidar uma pedra preciosa. Mas sei tocar, pedra a pedra, as pedras que tenho nas mãos e nos sonhos”.
Para Maria Teresa Horta não é só pedra a pedra que se constrói a poesia. É também corpo a corpo “sedução e pose, discurso do desejo a seduzir as palavras”, rigor a rigor, musa a musa, avidez a avidez, insubordinação a insubordinação, “cuidando de desmanchar as regras dos poemas, as imposições, as disciplinas”. Defendendo que “a escrita nunca esquece, nunca redime nem sublima”, Maria Teresa Horta terminou a sua intervenção dizendo que “aí, onde tu estás, é o começo da escrita”.
Seguiu-se Pedro Teixeira Neves, que também dedicou o seu texto à Madeira, ou não fosse a sua família de lá e ele tivesse nascido no continente “por acaso”. O escritor e jornalista tratou de apontar as várias semelhanças e diferenças entre pedra e poesia. “O poeta monumenta as emoções, por isso há poemas e livros que se confundem com catedrais”. Considera ainda que o poeta é um pedreiro “cujas pedras traz no peito” mas, como referiu, não convém que “transforme o poema num muro de lamentações”. Tal como as pedras, os poemas também corrompem e magoam. “Com pedras constroem-se casas, com poemas constroem-se abrigos”, acrescentou, considerando ainda, nesta relação de aproximação entre pedra e poema que, “com uma pedra pouco podemos, com uma palavra podemos muito mais”.
Mas nem tudo são semelhanças. De facto, e ao contrário dos poemas, as pedras não amadurecem, não surgem do nada, não fingem. Os poetas são impacientes, a poesia tem identidade. E existem pedras raras “mas os grandes poetas muito mais raros são”. Não podemos viver sem poesia, mas há quem pareça “conseguir viver sem poesia”. E se uma pedra é apenas uma pedra, “a poesia é sempre mais do que aquilo que parece ser”.

Rosa Alice Branco apoiou-se numa “extraordinária”dissertação de Vítor Hugo sobre a arquitectura como o grande livro da Humanidade. “Ao falar da arquitectura como arte soberana, Vítor Hugo declara que toda a História dos Homens, durante muito tempo, se pode ler nesta arte feita de pedra”. Assim, e à semelhança da escrita, também a arquitectura “se iniciou com letras, ou seja, o Homem começou a aprender a usar o alfabeto de pedra”. “Eu quando escrevo poemas é porque amo as palavras”, justificou, “o modo inusitado como tudo muda quando as palavras se juntam em versos e quando de verso em verso, pedra a pedra, todas se conjugam num poema”. E um poema só é poema, ou seja, as pedras estão no lugar quando, como explicou, “nada foge ao ritmo do corpo, debruçado à janela das palavras”.
Estreante no Correntes d’Esxcritas, tal como Rosa Alice Branco, Tiago Gomes confessou que pouco tempo teve para “alinhavar umas pedrinhas”. Sobre o tema, considerou que, no seu caso, “pedra a pedra também se desconstrói e destrói a poesia. Disse-me a Lídia Jorge há 20 anos atrás que a poesia devia ser burilada, trabalhada, esculpida”. E por isso leu um texto, “O Uso das Palavras”, de Nathalie Sarraute, de forma a ilustrar o efeito que as palavras têm quando aparecem.
Um pouco afastado da literatura, tem trabalhado “nas palavras ditas. Faço letras para bandas rock. Estou a tentar educar os músicos, que às vezes são um pouco bárbaros mas que também gostam de poesia”.

Ana Luísa Amaral e Ivo Machado dão voz às palavras na Escola Dr. Flávio Gonçalves

Infopóvoa / Póvoa de Varzim
A voz das palavras foi o tema que levou os escritores Ana Luísa Amaral e Ivo Machado à Escola E.B. 2/3 Dr. Flávio Gonçalves, esta manhã.
“Quem escreve dá voz às palavras, quem as lê dá-lhes outra voz”, assim o entende Ana Luísa Amaral que revelou nunca saber como é que um poema seu vai ser lido, isto porque “a voz é dada ao poema consoante o lado em que se está”. A escritora e professora disse ainda que “o poeta escreve quando tem necessidade de o fazer”, confessando que “escrevo poesia de forma muito inesperada”. “Há outros momentos, às vezes duas ou três da manhã, em pleno silêncio, em que tenho a sorte de uma visitação.” acrescentou Ana Luísa Amaral divulgando que também já lhe aconteceu escrever enquanto cozinha, como é o caso do poema “Leite creme” escrito enquanto fazia vitela assada.

A propósito do verso “Todos os dias alimento uma paz pequena” da sua autoria, Ana Luísa Amaral esclareceu os alunos respondendo que a “paz pequena” é “a minha normalidade, o meu refúgio, aquilo que me salva à minha volta. É a minha forma de me tentar proteger da violência e injustiça que me rodeiam”.
Sobre a voz das palavras, Ivo Machado referiu que “um livro só é livro quando o manuseamos, o lemos, o amamos”, ou seja “quando damos voz às palavras” acrescentando que “o processo de construção de um poema pode levar uma vida. O poema está sempre em construção.”. Sobre a sua relação com as palavras, o escritor afirmou que é como de um pai com o filho pois ama-as a todas e considera que são essenciais na sua vida, “tal como os meus filhos”, não sendo capaz de abdicar de umas palavras em relação a outras. Ivo Machado disse que existe um jogo de sedução do poeta com as palavras, sendo que “muitas vezes são elas que se nos impõem e pedem para ser usadas”. Sobre a sua escrita, referiu ainda que “toda a minha poesia é uma poesia de memória”, onde está presente a ilha onde nasceu “transporto a ilha em mim, apesar de já não viver lá”, reflectindo toda a ruralidade do lugar, pois considera que “todos nós somos uma consequência do nosso lugar de nascimento”. Questionado sobre a presença dos malmequeres na sua escrita, Ivo Machado afirmou que é “uma flor bonita e extremamente simples, que transporta uma magia que me acompanha desde a adolescência”, marcando as primeiras paixões e uma fase da sua vida.


Antes de encerrarem a sessão com a leitura de poemas da sua autoria, Ana Luísa Amaral e Ivo Machado revelaram que não são capazes de escrever um poema directamente no computador, o processo de escrita faz-se no papel com lápis ou caneta e muitas vezes no silêncio da noite.
As Correntes d’Escritas visitam outras escolas do concelho levando os escritores ao encontro dos alunos. No
portal municipal pode conhecer toda a programação do evento e acompanhá-lo diariamente.



Seis livros apresentados ontem à noite no Correntes d'Escritas


Infopóvoa / Póvoa de Varzim
As tertúlias à volta dos livros são a marca das noites do Correntes d'Escritas. Ontem foram apresentadas seis obras no Axis Vermar: Três vidas ao espelho, de Manuel da Silva Ramos; Inversos – Poesia 1990-2010; de Ana Luísa Amaral; O passado que seremos, de Inês Botelho; A lucidez do amor; de Tânia Ganho; A ordem do tigre, de J.J. Armas Marcelo; e Cinco de Outubro, de Lourenço Pereira Coutinho.
Manuel da Silva Ramos considera a sua última obra “não como uma mala de cartão, mas uma caixa de Pandora cheia de gargalhadas”. Para o autor, “este é um livro que ri e dói em andamento”. Este é um romance alegre e reparador, o elogio do emigrante português e dos contrabandistas da raia que tiveram um papel crucial na economia das regiões portuguesas vizinhas da fronteira espanhola.
Três vidas ao espelho conta a história de dois emigrantes que tiveram sucesso e mostra, de uma maneira detalhada, a vida nos finais dos anos quarenta de uma aldeia portuguesa perdida entre pedras e solidão, nos arredores de Vilar Formoso. Estas três vidas ao espelho, escolhidas entre milhentas outras da nossa diáspora, têm a pretensão de ser um poderoso elixir para desenvolver a nossa auto-estima nacional. Porque os três homens simples deste romance são heróis categóricos à sua maneira.
Ana Luísa Amaral leu quatro poemas da sua obra Inversos – Poesia 1990-2010. O livro reúne a poesia da autora dos últimos 20 anos e onde também constam alguns textos inéditos. Relembramos que a poetisa venceu o Prémio Literário Casino da Póvoa em 2007 com a obra A
Inês Botelho tem 23 anos e escreveu O passado que seremos. O livro traz-nos a história de um casal que, como tantos outros, sobrevivem em realidades diferentes. Elisa e Alexandre conhecem-se num fim-de-semana no Caramulo. São ambos jovens, pertencem a círculos diferentes, vêem o mundo de perspectivas quase sempre opostas – e, no entanto, parecem incapazes de escapar à atracção que lentamente os envolve. Com avanços e recuos, iniciam então uma relação que não entendem e questionam. Mas que os marcará para sempre.
“A lucidez do amor foi escrita quando tinha acabado de ter o meu filho. Em vez de escrever sobre os deleites da maternidade, resolvi debruçar-me sobre a guerra no Afeganistão.” Tânia Ganho explicou que a guerra é um tema que fascina a maior parte dos escritores, porque mostra o melhor e o pior do ser humano. Em A lucidez do amor, uns meses depois do 11 de Setembro, Michael Adam, piloto da Força Aérea francesa, é enviado para o Afeganistão no âmbito da luta contra o terrorismo. Passados quatro anos, parte novamente em missão, mas desta vez com plena consciência da natureza letal do seu trabalho. É com o inquietante pressentimento de que poderá não regressar a casa que se despede da mulher, Paula, e do filho recém-nascido. Atirada para um mundo sem homens, Paula é obrigada a tornar-se mãe solteira e a criar laços de amizade com o heterogéneo grupo de mulheres que a rodeia e que vive ao ritmo do toque do telefone – até ao dia em que as linhas ficam mudas…
J.J. Armas Marcelo apresentou A ordem do tigre, um romance que analisa com dureza e sem complacência os traumas da Argentina. Morelba a Tigra desapareceu e Álvaro Montes tem de regressar a Buenos Aires para a encontrar. Passaram muitos anos desde que, em 1975, numa viagem à Argentina, Álvaro e os loucos jovens com os quais percorreu os canais e os rios do Delta fundaram, na brincadeira, a Ordem do Tigre. Passou muito tempo desde que se enamorou de Morelba. No final do Século está tudo diferente: os seus amigos sofreram os golpes do amor e da política, converteram-se em cúmplices da ditadura ou em militantes clandestinos. Álvaro regressa ao passado para reviver a intensidade de uns dias que ainda permanecem na sua memória, apesar da distância e por cima da dor.
Por fim, Lourenço Pereira Coutinho apresentou Cinco de Outubro. O autor afirmou que gosta de encontrar nas suas obras duas personagens antagónicas, que mostrem os lados diferentes da história. Sobre a sua obra: D. Manuel II enfrentava nova crise governamental, após a queda do ministério Veiga Beirão. Entretanto, revolucionários e carbonários organizavam reuniões desencontradas, para o derrube da monarquia. Cinco de Outubro acompanha os percursos dos principais protagonistas da época – D. Manuel II, Teixeira de Sousa, Paiva Couceiro, Afonso Costa, Machado Santos –, que se cruzam com personagens ficcionados, numa narrativa de intensidade crescente que culmina nos dias da revolução republicana: 3, 4 e 5 de Outubro.
Os lançamentos continuam hoje às 12h30, desta vez na Casa da Juventude, com as obras de Paulo Kellerman e Pedro Teixeira Neves.

Biblioteca organiza Semana da Lectura


Infopóvoa / Póvoa de Varzim
Na próxima segunda-feira terá início a Semana da Leitura, uma iniciativa lançada pelo Ministério da Cultura, no âmbito do projecto Plano Nacional de Leitura, e desde sempre acolhida pelo Pelouro da Cultura. De 1 a 6 de Março, a Biblioteca Municipal realizará diversas iniciativas, quer no seu próprio espaço, quer em vários estabelecimentos de ensino do concelho. Formar novos leitores é o objectivo desta iniciativa.
A Escola EB1 de Terroso será a primeira a receber uma visita nesta Semana da Leitura. Na segunda-feira, nesta escola, será realizada a iniciativa “Eu e a Poesia”, uma sessão de poesia marcada pelo livro O meu primeiro álbum de poesia, de Alice Vieira. Os utentes do Instituto Maria da Paz Varzim vão, no mesmo dia, participar na actividade “Tricotando sonhos”, onde através de objectos são contadas histórias.
Na terça-feira, os técnicos da Biblioteca vão visitar o Jardim de Infância Pires Quesado com a actividade “Uma história para ouvir”, narração e dramatização da história Sopa de Letras, de João Manuel Ribeiro. Nesse dia, o Instituto Maria da Paz Varzim volta à Biblioteca, desta vez para participar em “Histórias em Labirinto”, onde as crianças poderão inventar um fim para os contos.
Na quarta-feira, alunos da Escola do Desterro, da Escola dos Sininhos e da Escola Nova vão à Biblioteca para estar com o escritor João Manuel Ribeiro em duas actividades: “Oficina de Escrita Criativa” e “Vamos brincar com histórias de rimar”. Ainda na quarta-feira, a Biblioteca irá realizar uma sessão de Destrava-Línguas, Lenga-lengas, Rimas, Provérbios e Acrósticos sobre livros, leitura e biblioteca. Na quinta-feira, repete-se a actividade “Tricotando sonhos” para os utentes do Centro Social Monsenhor Pires Quesado e “Era uma vez… uma folha de papel”, uma viagem até ao aparecimento da escrita e dos seus suportes. Também os idosos terão lugar nesta Semana da Leitura e no dia 4, no Centro Social e Paroquial de Terroso, haverá uma sessão de leitura animada.
Na sexta-feira, a Escola do Desterro, o Centro Social de S. Pedro de Rates, a Escola Nova e o Instituo Madre Matilde vão receber a visita de técnicos da Biblioteca com as actividades “Um conto contado e recontado”, as crianças ouvem e recontam a história apresentada; “Palavra puxa palavra”, a partir de uma palavra, e depois frases, as crianças vão escrever textos com princípio, meio e fim; “O meu boneco, a minha história”, apelo à criatividade da criança para construir uma história para a sua personagem e “Era uma vez… uma folha de papel”.
No sábado, a Biblioteca levará a cabo a habitual iniciativa “Sábados Mágicos...Leituras encantadas”, uma sessão de contos para pais e filhos, seguidos de ateliês de expressão plástica e de escrita lúdica.
Uma semana recheada de actividades pedagógicas, divertidas e que estimulam a imaginação dos leitores do futuro.

Paradoxos, perguntas e poucas respostas – assim foi a primeira mesa de debate

Infopóvoa / Póvoa de Varzim
“Escrevo para desiludir com mérito”, parte de uma frase de Agustina Bessa-Luís, foi o tema da 1ª mesa do Correntes d’Escritas, reunindo sete escritores, seis deles presentes pela primeira vez no Encontro.
A Catherine Dumas coube o papel de moderar o debate e avançar já com algumas ideias sobre o tema. “Quando lemos Agustina Bessa-Luís temos mais perguntas que respostas”, disse, antevendo as inúmeras questões que o aforismo “Escrevo para desiludir com mérito” iria levantar no Auditório Municipal.
“É um tema que vai para lá do críptico”, concordou Ana Luísa Amaral. Defendeu que todo o poema é sobre aquele que escreve, mas, ainda assim, a poetisa colocou várias questões. “Quem dá mérito? Quem outorga o valor? Quem escreve ou quem lê? E quem desilude? E se não houver leitor?”. Por entre as perguntas, Ana Luísa Amaral acabou por considerar que, de facto, não tinha resposta a este aforismo de Agustina Bessa-Luís. “Só dúvidas. A frase é toda ela feita de possibilidades”. Na sua opinião, o escritor quando escreve não pensa em que o vai ler mas sim no diálogo com ele próprio. Ora então, concluiu, a desilusão ou a ilusão é do próprio.
Primeiro Eduardo Pitta pensou que esta era uma frase infeliz. Depois, esta manhã, soube que era da autoria de Agustina Bessa-Luís. “Só podia ser dela”, afirmou o autor que acredita que “sempre que escrevemos estamos a desiludir até a nós próprios e seguramente os que estão à nossa volta. A escrita é sempre uma desilusão, mesmo para quem faz”. E de forma a ilustrar esta opinião, leu um poema de sua autoria, acerca de D. Pedro e D. Inês de Castro “em que eu faço uma leitura um pouco lateral à versão oficial”.
Fernando J. B. Martinho contou que a frase/tema de debate foi uma resposta de Agustina Bessa-Luís a um jornalista que lhe perguntou “a mais impertinente pergunta que se faz a um escritor – Porque escreve?”. “Escrevo para desiludir com mérito, que é a maneira de se fazer lembrar com virtude”, respondeu Agustina Bessa-Luís. “O paradoxo é a arma preferida de Agustina do seu riquíssimo arsenal retórico”, defendeu Fernando J. B. Martinho, mas, acabou por contar, só há mesmo uma resposta a dar “Porque escreve? Não se sabe exactamente”.
“Não esperem de mim esta erudição”, pediu Francisco Moita Flores, no início do seu contributo para este debate. Contou que, em criança, o seu pai comprava livros proibidos, que disfarçava forrando a capa com jornal. Tal fez com que Moita Flores lesse os livros do pai “antes de ler os Livros dos 5”. Depois, na escola, teve como professor de Português Manuel Marques da Cruz, “que amava Camões e lia Os Lusíadas a chorar”. E apesar de os alunos odiarem Os Lusíadas devido ao exercício de dividir orações, a verdade é que quando era o professor a ler, “a sua leitura trazia expectativas de esperança”.
Ao longo da sua vida, Moita Flores percebeu o que era censura, percebeu o que era poesia de combate. “Naquele tempo a poesia era uma arma, o poder tinha medo das palavras”. Depois, entrou na Polícia Judiciária. “Os meus olhos não são como os olhos dos outros escritores. Eu não tratava dos casos de crimes de gravata. Eu tratava dos homicídios, dos assaltos à mão armada. Vim desse mundo, do mundo da morte, do mundo do cadáver, das lágrimas, do sofrimento”. Até que surgiu a escrita, “de uma forma fluida, mais pelos escritores que fui lendo, fui escrevendo, em jornais, em revistas, depois fiz teatro, ensaios, até que comecei a escrever ficção, no cinema”. E foi aqui que Francisco Moita Flores se apercebeu que outros viam mais do que ele naquilo que escrevia. Os críticos, por exemplo, “diziam coisas que eu nunca vi”. E contando que a filha, a concorrer para um concurso de escrita lhe foi mostrar o trabalho para o pai ver se achava merecedor de um prémio, respondeu-lhe Moita Flores “Não te preocupes em ganhar prémios. Preocupa-te em seres como és”. Uma posição que o escritor e investigador aprendeu “com os homens que fizeram da escrita uma arma”.

Tentando desconstruir o tema, Gilda Nunes Barata avançou que o próprio nascimento ” já é desilusão, o corte do cordão umbilical é desilusão”. A criação, um começo, feito através de palavras e não palavras, tenta “desdobrar o conceito em momentos”. Levantando também ela algumas questões perguntou qual o acto criativo “que não quer ser contraditório”. E, na sua opinião, a desilusão tem sempre duas direcções: “desiludir, voltar a desiludir”.
Lamentando-se com a fraca sorte de ter um nome começado em Z, que o obriga a ser o último, Zuenir Ventura, jornalista e escritor brasileiro, trouxe boas gargalhas ao Auditório. “Também não sabia que esta frase era da Agustina, mas, se permitirem a paródia, na minha opinião é ‘Eu escrevo para iludir com mérito’. Eu não gosto de escrever, eu gosto de ter escrito”, brincou. “ É que esta é uma tarefa penosa, temos que procurar o adjectivo certo”, exemplificou. Uma afirmação estranha para quem escolheu ser jornalista e, posteriormente, escritor. Mas Zuenir Ventura contou que até tal escolha de profissões foi um acaso. “Nunca pensei ser jornalista nem escritor, mas não consigo viver sem fazer outra coisa”. Anda assim entre dois mundos, um pede realidade, outro pede ficção. A escrita, essa já se tornou uma segunda pele para o escritor que, para exemplificar esta dualidade entre realidade e ficção, entre ilusão e desilusão, contou como, hoje de manhã, lhe perguntaram se Cátia, personagem do livro Inveja – Mal Secreto (que o autor irá apresentar amanhã no decorrer do Correntes) era real. “Ali tudo é mentira, com algumas verdades. “
E assim se mataram as saudades dos debates animados que Correntes d’Escritas sempre proporcionou. Amanhã há mais, às 10h30, com a 2ª mesa de debate, novamente no Auditório Municipal.
Para mais informações, sobre o programa, os convidados ou outras actividades, visite o portal municipal em
www.cm-pvarzim.pt/go/correntesdescritas